… Quando Nietzsche chorou. Então quem me pergunta isso me olha com aquela cara de “ô, coitada, não sabe nada da vida!”
E nada adianta eu explicar que já li Nietzsche, que penso Nietzsche, que não concordo com tudo que Nietzsche disse, que penso sobre o que ele ‘filosofou’, que acho O AntiCristo o melhor até hoje. Nada. Toda vez, ouço o comentário:
“- Ah, mas você tem que ler é “Quando Nietzsche chorou”.
Ai, Jisus! Protegei-me!
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De presente, então, ofereço um pouco de Nietzsche para relembrar aos que o conhecem e para ampliar o repertório dos que souberam do tempo em que ele ‘chorou’:

“Os homens trataram até agora as mulheres como pássaros que, vindos das alturas, se perderam e vieram refugiar-se ao pé deles. Enfim, como algo de mais delicado, mais vulnerável, mais selvagem, mais esquisito, mais doce, com mais alma – mas algo que se deve engaiolar, para que não fuja.”

“A estupidez na cozinha! A mulher como cozinheira! A horripilante insensatez com que cuida da alimentação da família e do dono da casa! A mulher não percebe o que a comida significa, e quer ser cozinheira! Se a mulher fosse um ser pensante, cozinhando já há milhares de anos, teria obviamente feito as maiores descobertas fisiológicas, e ter-se-ia tornado mestra na arte de curar! Devido às más cozinheiras, pela falta total de bom senso na cozinha é que foi mais retardada, mais prejudicada a evolução do homem. Veja que isso pouco melhorou nos nossos dias. Que sirva de aviso para as jovens meninas.”
“O que na mulher inspira respeito e muitas vezes medo é a sua natureza, “mais natural” que a do homem, a sua genuína e astuciosa agilidade de animal feroz, a sua garra de tigre sob a luva, a sua ingenuidade no egoísmo, a impossibilidade de a educar e o seu instinto selvagem, as suas paixões e as suas virtudes inconcebíveis, vastas, inconstantes… Apesar do medo, o que faz com que tenhamos pena desta gata “mulher” perigosa e bela é que ela parece ser mais sofredora, mais vulnerável, mais necessitada de amor e mais condenada à desilusão do que qualquer outro animal.
Temor e compaixão: foi com estes sentimentos que até agora o homem se encontrou frente à mulher, já com um pé na tragédia, que dilacera na medida que encanta. Como? Isso ter-se-ia acabado agora? Estaria desaparecendo o encanto da mulher? Surge lentamente a mulher entediante? Ó Europa ! Europa! Conhece-se o animal com chifres* que para ti sempre foi o mais atraente, que representou sempre a ameaça para ti! A tua velha fábula podia mais uma vez tornar-se “história” – mais uma vez uma grande estupidez poderia apoderar-se de ti e arrastar-te! Nenhum deus estaria escondido sob ela, não!, apenas uma “idéia”, uma “idéia modernista”!
* O animal com cornos é o touro branco em que Zeus se transformou para raptar Europa.
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NIETZSCHE, Friedrich. Para Além do Bem e do Mal – Prelúdio a uma Filosofia do Futuro. Tradução Alex Clarins. São Paulo: Martin Claret, 2005. p. 154,156,159.
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Créditos das imagens:
http://www.marciomelo.com/2004/Mulherepassaro.jpg
http://static.flickr.com/55/147798575_c3b0d4eb48_o.jpg
(O Rapto de Europa: do pintor russo Valentin A. Serov)
