Posso admitir que não gosto de ver tv. Posso proclamar que não gosto de ver tv. Leio os jornais, leio as revistas, mas não gosto de ver tv.
Na semana que passou, ociosa em casa, resolvi ligar o Jornal Nacional e descobri, mais uma vez, porque não gosto de ver tv. Era a semana do crime que matou o menino João Hélio no Rio de Janeiro. Estarrecida com a apurada crueldade da cena, desliguei a tv assim que Fátima terminou a notícia. O caso precisava de maturação na minha mente, assim como quando leio. Não dava para saber de um fato bárbaro como aquele e, simplesmente, achar graça da propaganda de camisinhas feita pelo governo para o carnaval ou vibrar com a nova skol, sol, schin ou qualquer outra ‘cerva’ mais, desejar a nova coca-cola, ver as mulatas nuas do RJ comercializando a idéia de paraíso nudista que é o Brasil lá fora e banalizando a mulher aqui dentro especialmente. Não. O sorriso da Globeleza não combinava com a cena que eu acabara de ver.
Precisei, como quando leio, me afastar um pouco do assunto para maturá-lo. Precisei digerir, sentir náuseas, vomitar, engolir e ruminar por horas e mesmo pelos dias subseqüentes.
Se a tv tem a qualidade e a diversidade da imagem que tanto encanta, paradoxalmente é este também o seu maior defeito. Porque distrai. Desfoca.
Esperei um tempo passar. Li a reportagem emotiva e indignada que noticia o fato na Veja. Li o artigo daquele Mainardi que se revolta por tudo. Ouvi. Pensei. Refleti.
Não é preciso criar novas leis. É preciso educação, saúde, comida, água, conforto e tênis nike(!?). Isso é lugar-comum. Isso todo mundo sabe.
Mas, vivendo no país do jeitinho, só consigo pensar que é preciso maior rigor, maior fiscalização, mais ética profissional e punição sim, à bandidagem. Não dá para saber que um bandido, marginal, mesmo sem os privilégios do colarinho, entrou e saiu da cadeia seis vezes e mais sete poderá entrar e sair.
Não premeditaram, não fizeram porque ‘quiseram’, não creio. Mas o que importa é que eles não pararam, não pensaram. Encegueirados pela mola do crime, impulsionados pela impunidade a que cheira o país, seguiram impiedosamente em seu propósito. Assim banalizaram a minha, a sua, a de João e sua família e a própria vida deles, que já não vale nada mesmo. Pouco caso, descaso. Em troca de um som ou um tênis ou um notebook ou uma corrente de ouro: uma família, um povo e um país chocados pela barbárie.
Sem pena, mais punição e rigor!