Quem usa sapato alto, anda apenas na praça de alimentação do shopping Iguatemi e mora nas ilhas prediais de luxo da cidade de Salvador pode estar incomodado com o resultado na tela da filmagem de Ó paí, ó.
A preocupação de alguns é que se firme o estereótipo de baiano que aparece na telona no estilo Casseta & Planeta.
Terça-feira à noite, fui ao cinema conferir o resultado. Pasma, na cadeira, adorei ver a reprodução imagética da minha Bahia. Senti o filme como um recorte da cidade de Salvador. Andar pelo Pelô e na Feira de São Joaquim ou no Porto da Barra é realmente deparar-se com uma realidade que o cinema captou de forma quase documental, embora haja a recriação artística e a adaptação da ficção.
Olhe para aí, olhe (Ó paí, ó). Porque, cegos em seus guetos vigiados, os privilegiados da nossa cidade e do nosso mundo não vêem ou fingem não enxergar o que tanto incomoda na tela.
A Salvador que se incomoda com o que o filme apresenta é a mesma que fecha os olhos para o apartheid do carnaval baiano, a mesma que ignora com vidros fechados nas sinaleiras os menores pedintes, a mesma Salvador que despreza o negro, o pobre, o marginalizado. É uma Salvador que não se importa que haja cordeiros (seguradores de corda) no carnaval para os ricos pularem com conforto e segurança. É a Salvador que dá de ombros para os R$14,00 que cada cordeiro recebe. É a Salvador que não percebe a concorrência entre os catadores de lata que precisam de crachá e credencial para no carnaval arranjar um sustento.
Existem outras cidades que não aparecem no filme. A cidade da Mc Donald’s, do Horto Florestal, dos shoppings e condomínios de luxo. Não aparece no filme o menino de barriga cheia, nem o estudante das escolas particulares, os empresários da Tancredo Neves.
Mas a realidade de que trata Ó paí, ó é a vida cotidiana de moradores do Pelourinho, de Coutos, do Trobogy, de Paripe, do Subúrbio Ferroviário, da Ribeira… 44% da população de Salvador vive abaixo da linha da pobreza. Isso significa que não vai ao cinema, não tem emprego, moradia, dignidade garantida.
O filme só pode mesmo incomodar às ilhas de intelectualidade que gritam em cima de bancas universitárias num chilique que combate o estereótipo de um baiano que ri e dança apesar de. Tanta coisa.
Convido os preocupados com o recorte do filme a visitar São Joaquim, a andar pelo Pelourinho, olhando para além das portas e fachadas turísticas dos casarões. A visitar na Saúde os cortiços repletos de excluídos. Esta cidade faz festa, tem futebol e carnaval. Também tem tóxico, tráfico, vendedores de café, meninos na rua …
Gostei do resultado, tive vontade de aplaudir o filme ao final da sessão. Não me preocupo com aqueles que acharão que a Bahia é apenas isso nem com o preconceito de sulistas que se julgam superiores. Porque mais forte do que tudo para mim foi a divulgação de que a Bahia também é o que nos faz estupefactos exclamar: Ó paí, ó!
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Quarta, nas Faculdades Jorge Amado, recebemos parte do elenco do Bando de Teatro Olodum e Márcio Meirelles e outros convidados para um debate. Depois, mais informações e a resenha do evento.
eu sou sulista e felizmente não me acho superior, mas fiquei muito triste qdo cheguei aqui e vi uma Bahia tão diferente da vendida pela TV, ver tanto preconceito, tanto racismo, isso me doeu e dói até hoje, acho que quem se julga superior infelizmente são esses baianos que falam mal do filme, esses que não conhecem a cidade que vivem e nem seu povo, pra mim talvez seja esse o maior preconceito, o preconceito da casa mesmo, tô louca pra ir ver o filme, assim que der vou.
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Espero que tenha ficado bem claro que não me referi a todos os sulistas, mas à turma preconceituosa que se expressa assim. E que também há aqui. Em especial, critico ou alfineto o bando de jornalistas que desceram a madeira no filme sem nem atentar para o seu conteúdo ou para a nossa realidade.
Você, Mauricéia, que viveu aqui conhece a realidade e sabe bem de que estamos falando. Para mim, nem existe o pior preconceito. Qualquer forma de preconceito é pior.
Alena, estou mudando minha casa segue meu novo endereça a antiga será desativada, mas vc é sempre bem vinda !
Beijos (Paulinha do Encontros e Desencontros)
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Irei lá!
Alena,
Ainda não vi o filme. Gostei de ler o seu comentário positivo. Até agora só tinha lido negativos. Fiquei mais motivado para assistir.
Beijão
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Eu vou ver de novo! Os jornais do Sul cacetearam o filme.
Alena, ainda não fui assistir o filme. mas pretendo ir assim que puder. Foi muio legal o seu comentario. Salvador é mesmo uma cidade de constrate.Não sou baiana, mas adoro o povo daqui, pois me receberam muito bem, aqui encontrei outra familía, que considero como a minha.
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Francisca, estou em dívida contigo!!! Saudades e parabéns. Preciso vê-la. Dar um abraço especial.
Vá ver o filme sim.
E depois opine, diga o que pensou.
Gostei muito do seu comentário sobre o filme. Ele já estava na minha lista de prazeres-a-fazer e depois do que li marquei uma estrelinha de “imperdível”. Por outro lado, fico pensando que a sua crítica poderia ser universalizada para qualquer grande cidade brasileira.
Afinal, desigualdade, preconceito, elite que fecha os olhos, estereotipização do “povão”, etc etc etc, também acontecem aqui em BH, no Rio, em Sampa e por aí vai. Infelizmente.
beijo grande pra vc!
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É mesmo, as cidades brasileiras, talvez do mundo, são macrocosmos e também microcosmos que se espelham e refletem os mesmos problemas.
os termos brasileiros sao engraçados…
a ver tal filme…
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Veja sim, Fontez. É um recorte interessante da Bahia, de Salvador.
Òtima resenha. Ainda não vi o filme, mas vejo logo.
O blog está cada dia melhor. E o meu em plena “baianidade”, hehehe.
Um beijo