Você vai à consulta de rotina e… cai na real. Pela primeira vez.
É que a médica, autoridade máxima no assunto, lhe diz: ‘a partir de agora, qualquer hora é hora’. Ao que você responde: ‘Eu sei.’
Só que, à noite, quando você chega em casa, e deita a sua cabecinha no travesseiro para dormir e descansar para as aulas do dia seguinte, ‘parece que as coisas começam a fazer sentido’. Então, dá aquela vontade de levantar correndo, como se fosse um profissional no teatro, e encarar o espelho com a máscara pintada a derreter no monólogo desesperado de todos aqueles que se dão conta de algo muito, mas muito importante:
– ‘Qualquer hora é hora. A partir de agora. (ar de pouco caso). Qualquer hora… é hora. A – p-a-r-t-i-r -d-e – a-g-o-r-a. QUALQUER HORA É HORA (GRITANDO)! É HORA. MEU DEUS, É HORA! (Então bem baixinho em seguida diz a si no espelho que revela a realidade): É agora . É hora. Eu vou ser mãe. COMO ASSIM? MÃE?’
Então você se dá conta no meio da madrugada de verdade que nos próximos dias haverá um bebê, uma menininha de lacinho e tudo na cabeça, a se mexer em seu colo, completamente dependente. E ela terá saído de suas entranhas. E ela é fruto seu e do pai. E ambos estarão ali, pedaço seu e pedaço dele… E ela vai chorar, vai rir, vai crescer… vai virar criança, adolescente, adulto. De repente.
E então voê também se dá conta de que com você também foi assim. E estupefacta não crê que possa ter habitado um dia o útero de sua mãe.
Não creio em milagres. Mas este é um milagre. Não creio em mistérios. Mas este é um mistério.
E, muito de repente, de repente e longamente, você passa a madrugada inteira assustada com esta coisa que é a vida.