37 semanas

Você vai à consulta de rotina e… cai na real. Pela primeira vez.

É que a médica, autoridade máxima no assunto, lhe diz: ‘a partir de agora, qualquer hora é hora’. Ao que você responde: ‘Eu sei.’

Só que, à noite, quando você chega em casa, e deita a sua cabecinha no travesseiro para dormir e descansar para as aulas do dia seguinte, ‘parece que as coisas começam a fazer sentido’. Então, dá aquela vontade de levantar correndo, como se fosse um profissional no teatro, e encarar o espelho com a máscara pintada a derreter no monólogo desesperado de todos aqueles que se dão conta de algo muito, mas muito importante:

– ‘Qualquer hora é hora. A partir de agora. (ar de pouco caso). Qualquer hora… é hora. A – p-a-r-t-i-r -d-e – a-g-o-r-a. QUALQUER HORA É HORA (GRITANDO)! É HORA. MEU DEUS, É HORA! (Então bem baixinho em seguida diz a si no espelho que revela a realidade): É agora . É hora. Eu vou ser mãe. COMO ASSIM? MÃE?’

Então você se dá conta no meio da madrugada de verdade que nos próximos dias haverá um bebê, uma menininha de lacinho e tudo na cabeça, a se mexer em seu colo, completamente dependente. E ela terá saído de suas entranhas. E ela é fruto seu e do pai. E ambos estarão ali, pedaço seu e pedaço dele… E ela vai chorar, vai rir, vai crescer… vai virar criança, adolescente, adulto. De repente.

E então voê também se dá conta de que com você também foi assim. E estupefacta não crê que possa ter habitado um dia o útero de sua mãe.

Não creio em milagres. Mas este é um milagre. Não creio em mistérios. Mas este é um mistério.

E, muito de repente, de repente e longamente, você passa a madrugada inteira assustada com esta coisa que é a vida.

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Não é mentira

É verdade. Não, não é mentira.

A gravidez nem bem acabou ainda e o barrigão já deixa saudades. Estou na fase “alisa-barriga”… Até a semana 35 não tinha chegado a esta etapa, mas agora, completando 36 semanas, a redonda barriga já me deixa a suspirar.

Claro que desejo um dia voltar a ser mulher*… caber num jeans (meu Deus! calça Levis existe!) , usar vestidinho curto de verão, meu biquíne de lacinho… mas a barriga vai fazer falta, ah, vai…

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* nem vem que grávida é outra categoria!

Novidades e tal

A barriga está tão grande, mas tão grande, tão grande que não me deixa dormir mais direito. Não agüento ficar muitas horas na mesma posição. Vira daqui e dali e, de repente, a menininha resolve esmagar meu diafragma ou meus pulmões e acordo com falta de ar e taquicardia. Aí já era. Nada de dormir mais. Ontem, acordei às 4h35 (fui dormir à 1h). Hoje, acordei às 5h (fui dormir meia noite). Amanhã, não sei. Sei que vou dar uma canseira nela. Só vou deitar quando não agüentar mais.

Estou a pensar como é que os barrigudões de cerveja vivem. Que lesões na coluna eles têm. Não é possível que agüentem tanto tempo na vida com o barrigão.

Mas olha que eu estou feliz e curtindo tudinho. O quartinho não sei a troco de que mágica já está com aquele cheirinho delícia de neném. E eu não coloquei perfuminhos nem nada. As roupinhas, coitadinhas, ainda não podem cheirar a ‘comfort’ que o hospital recomenda trinta mil vezes nada de cheiros por causa da possibilidade de alergias. Tudo lavadinho com sabão de coco. Só. Que não tem cheiro delícia de nada. Mas de repente, bem de repente, o último mês chegou e de mansinho o cheirinho de bebê já impregnou todo o guarda-roupa dela.

Domingo, eu faço 33. Nem me preocupei com os 33 porque a semana 36 já chegou. Esta foi a contagem que andei fazendo nos últimos meses. Pela primeira vez na vida, meu aniversário não foi o tema nem a prioridade. “Filhos”. É assim que estou descobrindo esta história de deixar de ser o centro de minha própria vida.

Casamentos e tal

Há quinze dias, uma de minhas melhores amigas se casou. Bem, digamos assim, fez a cerimônia religiosa com toda aquela tradição e mais uma festa de arromba. Eles já viviam juntos e bem.

Sabe a satisfação que eu fiquei de ver o sorriso lindo dela e largo dele, ambos realizados com os amigos e todo o quiprocó que um casamento daqueles exigia ?

* * *

Foi a primeira festa de minha vida com a qual não me preocupei um segundo sequer com roupa. Isso foi muito bom. Eu sabia que iria e pronto. Com qualquer traje. O pretão básico arrastando no chão uns 20 números a mais que o meu  resolveu a questão. BENESSES DA GRAVIDEZ. E um achado de ouro. Ou melhor, de prata: uma sandália tipo havaianas, mas de couro pintado com strass. Uau! Nem sei mesmo por que é que usamos sapatos altos. Vá lá que eu os acho lindos, adoro, mas a noite inteira naquela sandalinha me deu a chance de pintar e bordar sem me cansar até 1h30 desde às 19.

* * *

Constatação melhor da noite: dancei, sacudi, abaixei e pulei freneticamente na boate. Mas dancei muito mesmo. Pensei que ou ia ter o bebê na madrugada ou ia acordar entrevada na manhã seguinte. Qual o quê! Parecia novinha em folha. Senti absolutamente nada. Só felicidade e bem-estar.

Conclusão: aborrecimentos é que fazem mal à saúde. Quando estamos bem, nada dói.

Pessoas insuportáveis

Existem pessoas que não se contentam em ser chatas. Precisam ser insuportáveis.

Conheço uma senhora que faz questão de ser intragável. Ela não consegue ser feliz sem marcar no seu caderninho diário a dose de encheção de saco alheio. Fico a imaginar ela sentada na cama, com sua caneta preta e uma lista (tenho certeza de que ela a tem) de pessoas (parentes, amigos e conhecidos) no seu rodízio semanal de perturbação da paz alheia.

A vida já não é fácil para todos nós. Todos temos problemas, contas, chateações, tpm’s e aborrecimentos bancários ou seja lá o que for que preocupe cada um de nós, humanos. Mas não. Não basta. Mala sem alça é pouco. Carrapato sanguessuga talvez seja mais apropriado. Não basta grudar: tem que usurpar toda a sua energia, tem que lhe causar uma irritação – mínima que seja, tem que destruir seus estoques de serotonina.

Gente assim vive só. E reclama muito. E faz-se de vítima. E arquiteta, de todas as maneiras possíveis, formas de fazer você se sentir culpada pelas suas dores. Sai pra lá. Que nessa eu não caio. Mas que me aborrece, ah, isso me aborrece mesmo. E muito.

Desesperadas

Minha irmã ficou. Eu fiquei.

Só quando o sétimo mês despontou na barriga é que a possibilidade real do bebê nascer apareceu para a gente. Então, o medo não foi o parto, não foi a saúde, não foi o médico nem a anestesia nem a injeção. O medo foi o enxoval.

É que eu passei a gravidez inteira no maior relax com o enxoval. Nem comprei nada. Nadica mesmo. Ganhei uma coisa aqui e outra ali e pronto. Fiquei esperando. Esperei fazer mais tempo ‘de barriga’. Esperei para ver se fazia ou não fazia chá de bebê. Esperei ter tempo porque estava trabalhando demais. Esperei fazer a mudança. E mês passado desesperei.

Faz um mês que eu estou no desespero das listinhas, lendo e relendo, passando e repassando, ‘ticando e reticando’ o que tenho e o que não tenho, o que preciso e o que não preciso, o que ainda vou comprar e o que não vou comprar.

Eu não sou de encomendas. Estas coisas demoram. Eu não aguento esperar (exceto o tempo de gravidez – o qual considerei pequeno até). Nas lojas que prestavam em Salvador, os prazos eram de 45 dias para entregar um enxoval. E se depois de pronto eu não gostasse? Se achasse que a qualidade não era lá tão boa assim? Não ia colocar o rostinho de minha neném numa áspera colcha de meia tigela. E se eles atrasassem? Se os pontos não saíssem bem feitos? Se o patchwork não me agradasse? Se ficasse feio?

Não, não, não. Sou mais prática. Gosto de comprar e levar para casa. Então foi assim. Namorei as revistas, escolhi, paguei e já faz uma semana ao menos que o berço pode recebê-la.

Ao menos.

O diacho é que a listinha é tão grandinha, tão grandinha, cheia de tantas coisinhas, que a toda hora você descobre que não tem mais uma coisa. E olha que eu não sou de supérfluos do tipo ‘aquecedor de mamadeira’ – uma vez que há fogão em minha casa.

* * *

Ainda continuo com a idéia de que grávidas deveriam ter licença-maternidade de dois anos e um cartão corporativo sem limites. Porque, por outro lado, não há nada mais gostoso na vida de uma mulher.