O sorriso de Alice

O sorriso de Alice tem algo assim de tão belo que derrete quem o vê. É largo, é meigo e é sincero, é espontâneo. É verdadeiro.

Descobri cedo, bem no meio da loucura pós-parto, quando eu me perguntava o que era que estava acontecendo comigo, ainda na primeira noite dolorida e desesperada da maternidade, quando eu não entendia ainda quem era aquele bebê que chorava em meu colo e que mamava quase sem parar, me deixando insana, foi naquela primeira noite ainda, no meio da madrugada, com menos de 24 horas de vida, que o sorriso de Alice me derreteu, me conquistou, me ensinou a amá-la.

Eu estava parada naquela cama desconfortável, à meia luz, com ela em meus braços, de frente para mim. Quem é você, bebê?  Como é que você saiu de mim?  Se eu não visse e não tivesse testemunhas referendadas, eu não acreditaria jamais que você era a minha filha… Quem é você, bebê? No meio das indagações e do estranhamento, sozinhas nós duas ( o pai dormia exausto no minúsculo sofá), Alice estava serena como um anjo ( não é metáfora!) e foi aí que sorriu pela primeira vez. Ou pela primeira vez que eu vi. E foi uma emoção indescritível. Aquela coisa que meio que aperta a garganta da gente, dá um nó, torna-a seca e se reverte em olhos marejados,explodindo num sorriso pleno d’amor. Foi assim. Foi assim que Alice me mostrou o seu sorriso.

Depois veio a apojadura, algo que nenhuma mulher merece. A cena é esdrúxula. Nem vou contar hoje ainda, deixa o trauma ficar mais distante. E a apojadura trouxe consigo o sentimento de incompetência. Incompetência maternal. Nunca pensei senti-lo. Mas o fato é que eu amamentei meio que por uma obrigação moral nestes dias. Porque não tinha vontade alguma. Só pensava em retirar meus seios  ( como se fossem um sutiã que a gente desconecta) e sair andando pelo mundo sem destino ( meio Forrest Gump) para nunca mais voltar. A vontade era desistir e a maternidade era entretanto irreversível. Como já falei, minha irmã foi fundamental. Alice sobreviveu a quatro peitos. Eu e Ilana a amamentamos. E nas minhas horas de desespero, Ilana a acalentava e dava-lhe de mamar. Falar deste desespero é preciso para voltar ao tema: o sorriso de Alice.

Pois era exatamente quando eu estava pensando em andar o resto da vida pelo mundo sem rumo, a vagar sem causa, sem sanidade, sem lógica, era exatamente neste momento que Alice sorria. E eu então permanecia ao seu lado, permanecia com o peito disposto a amamentá-la. E assim o amor vai brotando e adubando-se, dia após dia.

E tudo isso é porque eu preciso dividir que Alice agora sorri ao acordar e me ver, sorri porque reconhece o pai, sorri porque brincamos com ela, sorri se a nossa voz é doce, sorri se sente o cheiro de leite e sorri ao olhar os bichinhos do móbile em seu berço.

Uma doce menininha.

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Descobertas

Só depois de ser mãe, eu descobri que:

tenho muito mais coisa do que realmente preciso,

empregadas sozinhas em casa  fazem maquiagem nos cômodos ao invés de trabalhar direito,

as fraldas descartáveis devem ter a parte dos desenhos voltadas para frente,

a garrafa térmica no quarto do bebê não é para servir cafezinho,

a expressão “mãe 24h” não é uma hipérbole,

a minha vida só faz sentido por causa dela.

Critica quem pode…

Sempre que se vê um bebê na rua, ouvem-se muxoxos: “tão pequenininho…”, “eu, heim!”, “mãe desalmada!”, “coitadinho… tão novinho e já na rua!”

Fale quem puder, mas quem não tem filho, toma cerveja regularmente e está com a vida, digamos, ‘normal’ não tem o direito de dar palpite na saída de casa para respirar das mães que não têm com quem deixar seus filhos.

Alguém aí sabe o que é parto + apojadura + bebê recém-nascido + choros e mais choros + relógio biológico maluquíssimo + estar fora de forma + não ter nenhuma roupa agradável + não agüentar mais as quatro paredes ?

Ah, tá…

Os primeiros 15 dias com filho

É verdade que depois de 15 dias o desespero acaba. Eu contei cada minuto para que chegasse logo . E percebi que os primeiros 15 dias, na verdade, duram muito mais porque estamos em turno integral sem direito a descanso. Manhã, tarde, noite e madrugada inteira. Turnos e mais turnos. Sem uma horinha inteira para relaxar. Portanto estes primeiros 15 dias equivalem a mais ou menos uns 45 ou 60 dias.

Na manhã do décimo sétimo dia é que eu percebi a vida de novo. Registre-se.