Bacante

Se aí estivesse hoje, faria amor…

Bacante.

Olhos nos olhos ouvindo a canção.

É que eu tomei um vinho bom hoje há pouco

então a música tocou e me lembrei de ti

e tem dias em que a gente faz amor na vida…

Hoje eu faria… 

Do tipo olhos nos olhos e puro sentimento

quando penetrar é comunhão com o outro –

aquele momento único em que se sente o ser humano,

na hora em que se ouve estrelas e se 

sente como na nona sinfonia de Beethoven.

Estou toda mulher

materializada em seu desejo

sentindo intensamente. 

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O choque do contracheque

Hoje à tarde, eu recebi algumas ligações estranhas. Mandei sms perguntando quem era. Era uma mãe de aluna. A secretária havia dado (com cacófato, sim!) o meu telefone à figura (oi?). Mas era uma ótima mãe. De uma ótima aluna. E ela queria saber se eu poderia adiar a entrega do trabalho da filha.
Você pode estar aí pensando que eu disse não. Mas eu perguntei por quê? É que minha mãe me ensinou que “nada tem que ser, mas tudo pode ser”…
E ela, a mãe da aluna, me respondeu que a filha tinha resolvido doar a (linda e vasta) cabeleira ao GACC (Grupo de Apoio à Criança com Câncer) depois de visitá-lo. E ela, a mãe, não tinha tido tempo ainda de levar a garota para cortá-lo.

É que eu passei um trabalho em que cada aluno , após ler sobre o profeta Gentileza, ouvir músicas e estudar uns textos sobre ele e sobre o tema, fizesse uma gentileza urbana.
A garotinha de 13 anos leu, estudou, foi a instituições de caridade, plantou árvore, distribuiu flor na praça e… resolveu doar cabelo para fazer peruca para crianças com câncer.

E eu às vezes não sabia que se poderia ser tão melhor assim como humanos. E esses meninos e meninas podem ser. E eu gosto disso.

É. É esse o salário indireto de idealistas como eu que entram na sala de aula todos os dias.

Sim, e isso ameniza o choque do contracheque.

Porque eu.

Porque eu preciso de poesia. Porque eu preciso de amigos. Porque eu preciso de amor. Porque eu só sei amar inteira. Porque eu só sei caminhar feliz. Porque os meus fantasmas andam comigo, mas dançam de vez em quando. Porque eu sou a minha estrada. Porque a poeira faz parte. Porque o riso nunca foi preso. Porque não me mataram. 

 

 

Caminhos

O cinza das nuvens e a chuva pálida
há anos metaforizam o coração de concreto.
Se torrencial,
melhor ainda explicam os impossíveis.
E o nada.
O só.
E o vazio lamentável.
Mas conformado.
Itinerante recluso.
Tons amarelos,
árvores semimortas,
folhas caídas do outono de repente
fazem a atmosfera de inverno particular mudar.

Na lógica maluca do tempo,
as alegrias primaveris deveriam se estabelecer
e as cores invadirem os espaços internos.
Olhos de arco-íris.

Outras eras.
No contratempo biográfico,
o tempo de ré no renascer:
outono de quimeras.
Tempos mais brandos.
Felicidades mais simples.

Assim, assim.

Sobre o jogo Brasil x Alemanha

Enquanto eu não tinha filho, não me preocupava muito com o futuro (o a longo prazo). Era mais imediatista como cabia à minha juventude talvez. Era mais tensa mesmo com o daqui a pouco ou daqui a um ano. Sempre achei que tinha todo tempo do mundo como cantava a Legião. 
Hoje com Alice me sinto diferente e a cada fato que acontece me pego muitas vezes horas e, às vezes, dias, imersa em reflexões sobre o impacto que a educação dela terá sobre a sua pessoa (sabendo eu que tentamos acertar, mas não podemos assegurar vitória absoluta do que projetamos porque o outro é o outro). Vivo pensando no impacto que a minha forma de ver o mundo causa nela, no tom que verdadeiramente reverbera, nos ecos que ficarão… E, PRINCIPALMENTE, penso no que ensino sem saber que estou ensinando, no ‘currículo oculto’, na força do exemplo, da minha forma de agir que nem sempre é exatamente afinada com o que idealizo ou proponho nem o modelo ideal que almejamos. 
Quando fui vendo a derrota da seleção de futebol acontecendo e de forma tão realmente humilhante, me senti perdida no misto de meus próprios sentimentos e na necessidade urgente que eu tinha de traduzir aquela perda para ela, minha filha. O que dizer? Como agir?
Ela me viu triste, pensativa, chateada e me perguntou porquês o tempo todo. Não sei se soube responder como deveria. E ainda estou no meio do turbilhão. 
A certeza que tenho é que sou de uma geração que riu de si mesma, que riu do outro, que riu do país e que teve uma autoestima enquanto povo muito fraquinha. Exceto no futebol. Por isso jamais aceita perder uma partida, empatar ou mesmo ficar com prata ou bronze. 
E sei, na prática, também, que isso de malandragem, levar vantagem e se dar bem ficou muito longe de ser o ideal para educar o povo brasileiro. É um perfil que não conduz a bons caminhos.
E eu tenho uma outra certeza muito forte de que não gostaria de ver a minha filha crescer com autoestima baixa nem enquanto pessoa, nem enquanto mulher, nem como brasileira, latino americana. Já está mais do que na hora de uma outra história e tudo aponta para uma revisão da nossa identidade.
A propósito, incomoda-me profundamente a alcunha de povo sofredor porque sinto embutida nela uma justificativa que parece amainar a garra de fazer diferente. Um conformismo tácito foi gerado com esse MITO. 
Não consigo massacrar os jogadores, nem o goleiro, nem o técnico. Perdi junto com eles. Eles jogaram com a camisa que também visto por nascimento e por escolha. E não foram vendidos, não estavam pouco se lixando, não acharam graça nenhuma. Estão tão decepcionados quanto nós. A derrota deles é a derrota do país também. Sinto vergonha como eles e com eles. Fiquei puta, fiquei nervosa e fiquei com a cara de cu que os 200 milhões ficaram. 
Saí (para espairecer) após o jogo, fui ao mercado, abastecer a casa, retomar a vida, reajustar os trilhos… Fui, depois, caminhar sozinha com meus botões por uma hora. E vi muitas crianças levadas pelas mãos de seus pais, pelas mães, por suas avós… todas vestidinhas de verde e amarelo. E as maiores estavam com a decepção estampada no rosto ao lado de familiares que pareciam querer superar o próprio sentimento. As menores brincavam como se nada tivesse acontecido ou como se o passado já fosse mesmo passado no parque infantil às 21h do dia desse jogo. 
E nessa uma hora a pé… revi minha história pessoal e constatei que só quando me preparei bem obtive bons resultados. Ainda quando preparada, não garanti as vitórias que escolhi porque sempre houve, há e haverá mais variáveis do que a gente pode prever. Mas técnica, estudo, preparo, organização podem mais conduzir a resultados favoráveis. Foi o que a Alemanha imprimiu diante de um time que ficou atônito vendo a tsunami de gols levar seus sonho embora.
Então acho que cheguei ao que eu quero dizer a Alice agora: a vida continua, o parque está aqui e a escola amanhã de manhã. Não é hora de rir de si, não se escarnece de si próprio, não faça isso, filha, leve-se a sério. E isso não tem nada a ver com o fato de ser engraçada ou de saber rir das intempéries. Aprenda com a derrota, analise o que falhou e se reerga. Sempre. 
E nunca se esqueça de que somos nossos maiores inimigos. 
Apenas uma seleção ganhará. A gente não ganha todas e a vida nos bate diariamente. Ficamos entre as quatro melhores. Já tem um mundo para bater na gente e não sou eu que vou ficar dando soco no espelho. Hora de catar os cacos e repensar os caminhos, fazendo, com certeza, escolhas diferentes das que conduziram à derrota.