Rio

Além das maravilhas óbvias da cidade maravilhosa, o Rio tem padarias incríveis que fazem croissant como nenhuma na Bahia sabe fazer. Pães fofinhos, daqueles que sabemos que se enfiarmos o dedo, a massa volta para o lugar.
O Rio tem dias nublados e ares cinzentos que também nos fazem acalanto por identidade, idade e ecos de Clarice na alma, além do sol e da praia e dos biquínes sorrindo. O Rio é democrático.
E cosmopolita. O Rio tem lojinhas em Copacabana onde a gente encontra das moderníssimas invenções em designe e tecnologia às poeiras do tempo e às decadências de outrora.
Tem velhinhas passeando maquiadas, resquícios de uma era em já foram as garotas da praia. Senhorinhas de salto alto e cabelinho penteado, andando devagarinho nas calçadas irregulares, despertando-nos ternura. O Rio tem moleques com caras felizes e crianças com ginga. Vendedores cheios de saquinhos pendurados a nos oferecer o petisco mata fome pela janela dos automóveis parados ou coletivos cheios. Tem lavadeiras gordinhas que, ao subir o morro depois de um dia cansativo de trabalho, se deparam resignadamente com a polícia a revistar suas sacolas e uma fila enorme para ter acesso à ladeira que leva à sua casa.
O Rio tem olhos verdes, gateados, mulheres incríveis e meninos do Rio, sim, de provocar arrepio. Tatuagens incríveis. Pranchas e ondas e varas de pescar nas pedras da Niemeyer. Engarrafamentos que poderiam nos matar de pressa ou de raiva ou de tédio não fosse o deslumbramento e o assombro de tanta beleza que nos faz , sinceramente, agradecer pelo trânsito ser tão lento.
O Rio tem nuvens densas que fazem a Gávea ficar envolta em atmosferas oníricas e nos levam a portais de outras dimensões, perdidas que ficamos a contemplá-la. É a cidade dentro da mata ou a mata dentro da cidade? Cada árvore, cada planta de um tom verde escuro, e trepadeiras e parasitas subindo aqui e acolá. Terra de gradis e arquitetura sui generis.
Tem samba em cada esquina, feijoada em cada morada e carne seca de sabor único. Supermercados cheios de frutas apetitosas, folhas verdinhas e tenras e uma diversidade de industrializados de nos fazer perder hoooras a ler rótulos e indecisas sobre o que levar.

O Rio convida à poesia, seja na lagoa, na Glória, em Santa Teresa ou Ipanema. É terra de grandes homens, de grandes escritores, músicos incomparáveis e índios memoráveis; terra que precisa, ainda hoje, de melhores caciques para seu povo.

O Rio é bonito de baixo para cima e de cima para baixo.

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Nude

Dia nude

ao som  de Nando Reis e Skank “Sutilmente”

Estou no Rio para ver se rio mais.
Vim domingo, estou em casa de amiga, me divertindo e sendo feliz como manda o fakebook. Conheci gente interessante e ampliei um pouquinho este círculo de amigos que podem enfim nos apresentar a um namorado novo, quem sabe?!
Afora… andando, como Alena Gump, parente daquele outro, para ver se faz sentido a vida. Período sabático, estou me dando o prazer de me reencontrar em essência depois que tantas coisas se perderam pela vida. Ou de me reinventar.
Não, não estou triste, mas de vez em quando choro um pouquinho. Mais de emoção que de tristeza. Nas entrelinhas, vez ou outra, fico triste também. Nesta medida inexata que é a vida.
Beijo


Alena

P.S.: Aqui estou on tb, que amigo que se preza tem casa wi-fi.

 

Bebê internauta

Ela tem cinco anos. É uma gracinha. Pela desenvoltura, pensamos muitas vezes que estamos com uma minigente, daquelas mocinhas descoladas e irreverentes. Mas ela só tem cinco anos. É uma criança ainda.

Para quem não conhece ultra-som obstétrico, desvendo-o: a médica fotografa o feto no útero, coloca cinco imagens do bebê numa página tamanho a4 e mais uma imagem da tela do pc, na qual aparecem os dados da gestação: centímetros do embrião, semanas desde a fecundação e nome da gestante. As fotos a que aludi mais a dos dados na tela do pc ficaram dispostas em duas colunas, de forma que, ao lado da freqüência cardíaca do bebê, aparece a tal tela.

Pois bem, vamos à história então.

A referida garotinha é filha do meu namorado. É um trocinho. Inteligente, gordinha e super feminina. Depois de passar um dia delicioso na praia com ela e a irmã de 12 anos (uma princesa tímida), brincando, comendo as delícias da Bahia, lá para as quatro da tarde, já com o sol fraquinho (creiam!), ficamos rolando na água, curtindo as ondas no raso. Pintamos e bordamos. Mergulhamos, abraçamo-nos, divertindo-nos até não poder mais! Saímos do mar de mãos dadas, rindo à toa.

Então… neste dia tão gostoso, o pai considerou que era a melhor hora… e, ao voltarmos à casa, enquanto eu subia para tomar banho, ele contou às meninas que eu ‘estava de neném’.

Foi surpresa para mim que contasse naquela hora. Quando desci, elas quiseram saber se era verdade e então …  subi correndo com elas para mostrar-lhes o exame, explicar que as imagens eram do irmãozinho ou irmãzinha que  viria. Aí foi tudo uma delícia. Pensei até delas ficarem com ciúmes dele, mas surpreendi-me com a ciumeira de mim: foi um grude, elas queriam garantir que eu não deixaria de brincar com elas. Neste dia, dei banho, penteei cabelos e contei história na cama.

Ela só tem cinco anos. Foi assim que começou esta história. Lembram?

E a pequenininha, entretida com a grande novidade e com as imagens do ultra-som, exclamava sem parar, debruçada sobre o exame:

– Ô… que bunitinho… olha a cabecinha do meu irmãozinho ou irmãzinha, olha o bracinho… ô… aqui é a perninha… aqui é a mãozinha… ô … que lindinho, olha a perninha… olha o bracinho… olha a cabecinha… 

Eu já estava  enternecida com o jeitinho dela, quando ela, apontando para a imagem da tela do pc que estava no ultra-som, disparou:

– … olha a barriguinha… ô, olha o bracinho… ô… a cabecinha… e aqui é ele brincando na internet.

Gente, caí na gargalhada, dei um abraço forte nela e … foi assim que meu filho ou minha filha, descendente que se preza, bebê do terceiro milênio, herdeiro de mãe blogueira, que ainda nem nasceu, já caiu na rede: meu útero wireless é formidável!

Uh-lá-lá!

A vida é bela, mesmo que um monte de gente perca tempo sentindo inveja de você, querendo depreciá-la, com dor de cotovelo… A vida é bela ainda que tenham batido em seu carro, você tenha pagado juros de todas as contas, dormido pouco várias vezes, emagrecido e engordado na sanfona de um corpo que nem sabe o que vai fazer durante os festejos juninos. Maio está acabando e só isso é um bom sinal: virão as férias.

Retada como só uma baiana pode ficar, fui dormir ontem disposta a acordar hoje diferente. Mas nem contava muito com nada. Olhei o calendário e me dei conta de que só faltavam quatro dias para junho chegar. Só isto já me fez bem. Cansada de especular, pensar, falar, resolvi agir.

É segunda-feira então. Acordo bem, cedinho, disposta, abraço e faço carinho durante meia hora, tomo um banho, visto uma roupa que adoro, o jeans que outrora não entrava mais e calço bota de salto fino (bingo! – afinal fez frio em Salvador).

Vou à aula, o trânsito está livre, há engarrafamento apenas no estacionamento da faculdade, estou séria, mas não perco o humor.  Encontro alunas que valem a  profissão, converso com elas, descontraio. Agendo as tarefas da semana dentro do tempo possível e não da maluquice de prazos que me imponho cotidiamente.

Umas pessoas tentam me convencer de que estou zangada, séria ou “diferente”; não aceito nem engulo este discurso; percebo claramente o caráter de alunos que me tentam ludibriar o tempo inteiro e constato que cada um é que sabe de seu caminho. Sorrio então ironicamente com o canto de boca. Aquele risinho só meu, imperceptível para o mundo alheio e ensimesmado. Eu vou me vingar? De jeito nenhum… A vida que surre ou beije quem quer que seja.

É hora de retornar, consigo trocar a aula vespertina, vou ao Detran resolver o pepino do carro batido, não há engarrafamento em pleno meio-dia, ou melhor, há sim, do outro lado da pista, os carros estão parados em fila interminável, mas a minha flui a 80… O gato liga, a Secretaria de trânsito não tem uma fila sequer; na xerox, só uma pessoa na minha frente… Menos de cinco minutos e tudo resolvido. Volto para casa.

Decido comer bem e cozinhar a  semana inteira. Então asso o peixe com legumes em oliva abundante à moda lisboeta. Um bom pão de linhaça, salada de rúcula, alface, espinafre, pimentões e picles… Logo o peixe aromatiza toda a casa e o arroz feito com cenourinha deixa a mesa ainda mais bonita.

Recebo duas boas notícias por telefone e fax.

Se a campainha tocar e aparecer um homem lindo e apaixonado com um bouquet enorme de rosas amarelas (as minhas preferidas), vocês podem dizer até que eu estou sonhando ou mentindo…

It’s raining men! Aleluia!

A mamãe e sua ninhada -1- Bruno 2 -Felipe 3-David

Vou ter que parir meninas!!! Nossa, meus amigos de longa data só dão à luz meninos!

Já estou preparando uma escolinha de futebol… algo do gênero. Todos os meus amigos que tiveram filhos só trouxeram machos ao mundo. De tanto a gente reclamar que falta homem no pedaço, a turma caprichou. Léo, Rafinha, Bruno, Daniel, João Vítor, Mateus e…

Acabaram de nascer Bruno, Felipe e David, trigêmeos. A mamãe (ufa!) está livre de comprar os fardos de absorventes quando as crianças se transformarem em adolescentes. Imagina só ela na farmácia delivery do futuro no fim de semana na praia:

– Alô? Por favor, vocês podem entregar quatro caixas de Ob no endereço tal?

A farmácia ia pensar que era trote o tempo inteiro. Do concorrente.

Em compensação, já falei ao papai para se preparar na fila do posto de saúde : haja camisinha grátis! Se fosse usar o disque farmácia, corria o risco de parecer o garanhão ou o fraudador, pedindo 16 camisinhas para o sabadão (ahahaahahaha!).

Para a genitora que padecerá (quem disse que é no paraíso?) mais uma boa nova: na hora da hiperatividade, papai é que vai inventar bicicleta, jogos, praia e caminhadas com trilha. Nada de ver trezentas panelinhas de plástico espalhadas pela casa nem duas dúzias de bonequinhas com aqueles nomes que as crianças nunca esquecem, mas a gente sempre atrapalha. Ai,ai… ia me esquecendo: ninguém terá paz, nada de andar descalço pela casa a pisar nos trinta e cinco mil legos que as crianças ganharão. E chama o papai e os titios para ajudar a montá-los.

Ufa! Aniversário : economia geral! Basta um bolo e brigadeiro para todo mundo. O difícil nestes tempos de arrocha econômico é convencer os convidados a irem. Três presentes de vez no orçamento é sacrifício (risos). A titia aqui está fazendo um caixa dois e um caixa três para dar conta do recado.

Mas se os pais escaparam da água derramada na sala porque não haverá panelinhas com comidinhas exóticas de mentirinha nem bules e chaleirinhas em miniatura, por outro podem ter certeza de que haverá o mesmo líqüido na casa inteira esparramado. É simples: meninos brincam com pistolas d’água. Era uma vez o sofá que servirá de trincheira.

Já adverti a mamãe incauta: sua sala de jantar será jamais a mesma. As pernas da mesa dão ótimas traves, qualquer criança sabe disso. E vasinhos de cristal, porcelanas e biscuits já podem ser leiloados pela família. Virarão caquinhos se a mãe insistir em (man)tê-los.

Afora tanta brincadeira, é com grande alegria que celebramos o nascimento dos meninos. Eles vêm consolidar uma história de amor e  abençoar um casal que há muito deseja os descendentes.

Bem vindos a este mundo, meninos, boa sorte papai e mamãe! Muita saúde e amor para toda a família é o que posso desejar.

O poder de um pênis

Pênis. Esta foi a palavra mágica capaz de parar por mais de 15 minutos a aula inteira. Falei na palavra pênis. Gritos e risadas incontidas. Compulsão ao riso, à gargalhada, ao descontrole. Barulho de trinta vozes contando histórias, discutindo, falando … E, quanto mais eu falava, mais riso, mais balbúrdia.

O caso foi o seguinte: a aula era sobre leituras do vídeo, cinema e da arte. Então me lembrei de contar o vídeo que vi projetado na sala do Museu Rodin Bahia.  A filmagem é algo interessantíssimo: um líqüido vermelho-amarelo fritando, o dendê. O som do dendê no fogo foi colocado na sala da projeção para ambientar a cena mais ou menos como as exposições de Andy Warhol, e, no meio da liquidez do azeite, percebe-se a subexposição de um pênis ereto.  É místico, mágico e artístico o vídeo.

Mas bastou eu falar a palavra pênis que eu nem consegui explicar mais nada. Pura confusão. Deixei o clima como estava e os alunos gastarem as emoções. Uma parte estava enfadada, mas a outra – a maioria – eufórica. Percebi então o efeito catártico que tinha desencadeado e sugeri-lhes alguns exercícios. Primeiro, que repensassem o que consideravam imoral, pornográfico e indecente. Depois, que lessem Rubem Fonseca (particularmente Intestino Grosso e O Campeonato). Para encontrar um ponto de equilíbrio, que usassem a terapia para a síndrome de La Tourette (coprolalia): falassem, gritassem todos os nomes que conhecessem para vagina, pênis e sexo. Não, eles não toparam, contidos. ‘Expliquei-lhes’ então  que sexo é natural (muitos risos, muito assombro, muita gargalhada) e que a Igreja impôs a inferno, fogueira e guilhotina a idéia de sexo como pecado. Uns olhos se arregalaram ao ouvir que todos os avós e as avós e pais e mães fizeram sexo para que nascêssemos. Pedi-lhes para análise deles que buscassem então no cinema dois filmes de escolha própria sobre o sexo, o erotismo, a sedução.

Não consegui controlar os risos deles, as gargalhadas deles… tudo por causa do poder de um pênis. E falado. Imagina só se visto, tocado, sentido, gozado…

* * *

Glauber ainda me fez conseguir encerrar a aula na faculdade, graças.

Quando Nietzsche chorou…

ele havia descoberto que, mesmo tendo lido sobre a insensatez da mulher no modo de cuidar da família (quiá, quiá, quiá) , eu resolvi, em tempos moderninhos, ultra contemporâneos, atacar na cozinha com uns defumados , um bom feijão preto, negrinho, bacon, toucinho, barriga de porco, lombo e carne de boi, além dos chouriços, claro!

Aí Nietzsche chorou mais ao constatar que eu não sou um ser pensante, lógico, porque sou mulher,  e não consegui perceber o que a comida significa, tipo ‘a feijoada era a comida dos escravos, feita com as partes não muito nobres dos animais’.

E Nietzche se desaguou em lágrimas ao ter certeza mesmo de que a única descoberta fisiológica que eu fiz foi que feijão dá gases e se for mal feito dá dor-de-barriga.

Como ele mesmo constatou, a mulher na cozinha retardou a evolução do homem, porque, por exemplo, esta feijoada gostosíssima que acima aparece será consumida com pimenta baiana e farinha de mandioca da fininha apenas para nos dar combustível nos dias de carnaval que virão. Ou seja, se a mulher pensasse, jamais contribuiria para a política do panem et circenses se perpetuar!

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(Foto da minha feijoada cometida para o carnaval)