Eu não sou essa mulher

Eu não sou essa mulher que toma sopa e come pão diariamente.

Eu não sou essa mulher que ouve desaforos e se cala.

Eu não sou essa mulher que se oprime, se deixa dominar, se deixa humilhar.

Eu não sou essa mulher que cantarola consolada as torturas sertanejas.

Eu não sou essa mulher que agradece por ter se casado.

Eu não sou essa mulher que vê no relacionamento seu único motivo de felicidade.

Eu não sou essa mulher sem filhos.

Eu não sou essa mulher workaholic.

Eu não sou essa mulher sem palpite.

Eu não sou essa mulher sem voz.

Eu não sou essa mulher sem história.

Eu não sou essa mulher sem paladar.

Eu não sou essa mulher sem gosto.

Eu não sou essa mulher sem fogo.

Eu não sou essa mulher que não dança.

Eu não sou essa mulher que não ri.

Eu não sou essa mulher sem expressão.

Eu não sou essa mulher afastada da arte.

Eu não sou essa mulher silenciada pelo Jornal Nacional.

Eu não sou essa mulher sem dinheiro.

Eu não sou essa mulher temerosa.

Eu não sou essa mulher que vai à Igreja.

Eu não sou essa mulher que engole sapos e comida mal feita.

Eu não sou essa mulher que chora todos os dias.

Eu não sou a mulher que nunca chora.

Eu não sou essa mulher injusta.

Eu não sou essa mulher ofensiva.

Eu não sou essa mulher displicente.

Eu não sou essa mulher sem sonhos.

Eu não sou essa mulher sem brilho.

Eu não sou essa mulher de auto-estima esmagada.

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Ato consumado. Depois: papel assinado.

Mês passado, fui convidada a um casamento. É. Um casamento. Enquanto me arrumava… meu deus, as pessoas ainda se casam!

foto: Alena Cairo

O noivo e a noivinha em questão moravam juntos. A lua-de-mel já fôra há uns quinhentos anos. Ainda assim, ainda que convivendo, ainda que conhecedores das mazelas do estar juntos, ainda que cientes das faces não maquiagem da mulher e das flatulências e arrotos masculinos, ainda assim, sem unha pintada, sem tênis novo e com muitas disputas pela privada, eles se reuniram na tradicionalíssima igreja. É. É verdade.

foto: Alena Cairo

Casalzinho bonitinho e interessante. Um verdadeiro amor. Chá bar moderninho, convite divertido – que este photoshop faz é coisa, música ao vivo e até despedida em cantoria do noivo da vida de solteiro (um show à parte) divertiram convidados que presentearam o casal com lembrancinhas inúteis e verdadeiras utilidades (leia-se necessidades) domésticas.

Ambos: mesma profissão. Ponto positivo? Nem sei. Há tantas divergências nas convergências! Eles viajam muito. Ah, então é isso… Vai ver que não se conhecem ainda– dirão os céticos.

Sei não… sei não…

Era noite, eu estava toda prosa, de saltinho alto, felicíssima com meus cabelos soltos, dirigindo meu carro e minha vida até que o tarãran tarãran tan tan tan tan.. tan tan… ecoou naquele espaço soberbo da arte e aquele vestidão todo passou pela minha frente. Uma só lágrima ridícula umedeceu meus olhos de convicta mulher moderna e bateu então uma vontaaaade de representar também o papel!

Ahahaha… passou, passou. Pelo menos até o próximo sábado, quem sabe (?), quando vou novamente a outro casamento (epidemia?).

A melhor parte, sem sombra de dúvidas, além da carinha de felicidade da minha amiga e do seu respeitadíssimo marido abençoado por deus e bonito por natureza (mas que beleza!) , foi o buffet maravilhoso da Belle’s. Comi tanto que voltei cinderela para casa: eclair do vestido aberto para respirar.

fotos : Alena Cairo

Proibido ser mulher

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É proibido ter passado.

 É proibido ser quem você é.

 

É proibido não ser virgem.

É proibido ter amado.

É proibido ter morado junto.

É proibido ter sentido desejo.

Na mente, no corpo, no sexo.

 

 

É proibido gozar.

Gozar é feio.

Mulher não goza.

Mulher não trepa.

 

 

É proibido fazer dieta.

É proibido fazer escova.

É proibido pintar as unhas de vermelho.

É proibido usar decote.

É proibido receber os amigos em casa.

É proibido ter casa se não se casa.

 

 

É proibido sair à noite sozinha, voltar para casa tão tarde.

 

Mulher não deveria beber.

Mulher não deveria saber.

Mulher não deveria querer.

Nem trabalhar.

Nem pagar suas contas.

Nem trepar.

 

Mulher abaixa a cabeça.

Mulher fala manso.

Mulher não diz palavrão.

Mulher não sente tesão.

 

Mulher é educada.

Mulher é mosca morta.

Mulher não se vinga.

Mulher não grita, não quebra prato, não se irrita.

 

Mulher não bebe muito.

Mulher não bebe cerveja.

Mulher nem bebe.

Só água, sucos e coquetéis sem álcool.

 

Mulher não vai ao estádio.

Mulher não vê jogo.

Mulher não anda em bar.

Mulher não conta piada.

Mulher é a piada na cabeça de machistas anacrônicos de plantão.

 

 

Conte-me outra.

Se assim é,

não posso ser uma mulher.

 

Mulher, meu caro, é tudo que se quer.

Ser.

 

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Crise e caos

Este é meu exato problema.

Embriago-me deveras estudando, adoro os livros, amo-os!

Vivo mil vidas na Literatura, sofro, choro, sorrio, amo para sempre e morro. Mas chega um dia em que me dou conta de que pode ser que a vida esteja passando e eu aqui…

O que fiz? O que faço? O que farei?

Não sou nenhum eremita. Saio, passeio, me distraio. Mas meus programas são tão torta com chocolate que eu apavoro quando vejo esta Bahia fervilhando de ensaios e festas mil.  É difícil andar na contramão da história. 

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Créditos das imagens: http://www.magazine-litteraire.com/images/045-01-108010.jpg

http://i5.photobucket.com/albums/y170/Nimby33/Eremita_Nimbypolis.jpg

Idéia besta

O supermercado Bompreço da praia de Armação teve a idéia de – sabe-se lá por quê! – colocar uma onça de pelúcia em tamanho natural  na entrada da loja entre folhagens abundantes. Juro que eu tomei um susto hoje. Ridículo. Apesar do terceiro grau, apesar do impossível, apesar do surrealismo da cena, tomei, sim, um susto. Imagina as velhinhas que sofrem do coração…

Cercas

Durante muitos anos, eu comprei briga com as “puladas de cerca”. Se não fosse esse tal de amor a querer exclusividade em todo o seu potencial egoísmo… talvez de forma leve todos os casais pudessem estar mais tempo juntos… ou talvez outros estivessem há mais tempo separados.
Hoje prefiro, como mulher, não pensar muito nisso. E entender que os desejos aparecem. Não podemos crucificar-nos e nem guilhotinar os outros.
Mas a liberdade é melhor quando não se ama. Amando, estamos em cárcere da consciência. E da culpa que o outro tenta nos impingir.

Constatação

É preciso não sufocar o grito, não negar os rasgos, escrever as cartas… não poupar o outro para não violar a alma. Há quereres nossos imperativos e há vazios ansiando a completude.

O pôr-do-sol requer tarde límpida, mar de ilha e casal apaixonado. Eu quero você.